segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

O Desafio da Transformação Interior


Depois de mais de seis mil anos de história do homem na terra, muitos defendem que o mundo continua em situação de atraso. As notícias crescentes de violência, a manutenção do estado de guerras em vários pontos do planeta, a enorme desigualdade social que alimenta a miséria e a ignorância são alguns indicadores que supostamente justificariam a defesa deste ponto de vista. Como a mídia divulga preponderantemente notícias negativas, a visão global tende a direcionar exatamente para esta conclusão. Outra realidade, porém, semelhante a espiritual, acontece sem que se dê a devida promoção pública. O bem nunca esteve tão em moda. Religiões, ONGs, grupos humanitários, entre outros movimentos, esforçam-se em melhorar a condição de vida das pessoas e de si próprias. Imprescindível saber que a transformação do mundo somente ocorrerá mediante a transformação de cada um, a transformação interior.

O núcleo convergente para onde se dirigem todas as ações do Espiritismo é a transformação moral do ser humano. Transformação que necessita ser entendida como uma construção gradativa de valores, uma proposta de plenitude, um processo libertador da consciência e de formação do homem de bem. Não pode ser entendida apenas como contenção de impulsos inferiores, mas como a criação de condicionamentos novos e elevados. A reforma interior é tomar consciência do "si mesmo", da "perfeição latente" à qual nos destinamos. É um ato de auto-educação que não ocorre sem dores, no entanto, não deve ser encarada como um martírio - que é uma forma de autopunição -, mas como um processo de conscientização. Crescer não significa sofrer como resgate, representa possibilidade de educação para propiciar a libertação. Não é a intensidade da dor que educa e sim o esforço de aprender amenizá-las. Assim, transformação interior deve ser considerada como melhoria de nós mesmos e não a anulação de uma parte de nós considerada ruim. É uma proposta de aperfeiçoamento gradativo cujo objetivo maior é a felicidade.

A transformação interior é um trabalho processual e deve ser entendida como a habilidade de lidar com as características da personalidade melhorando os traços que compõem suas formas de manifestação como caráter, temperamento, valores, vícios, hábitos e desejos. Uma ética de autotransformação implica em ter postura aprendiz, observação de si mesmo, renúncia, aceitação da sombra, autoperdão, cumplicidade com a decisão de crescer, vigilância, oração, trabalho, tolerância, amor incondicional, socialização e caridade. É comum ouvirmos no meio espírita a necessidade de "matar o homem velho", "extinguir as sombras" ou "vencer o passado". Tais expressões são equivocadas, pois não eliminamos nada do que fomos um dia, transformamos para melhor. Na prática, o caminho a ser seguido é o de harmonizar-se com a sombra e de conquista do passado, pois transformação interior nada mais é do que dar nova direção aos valores que já possuímos e corrigir deficiências cujas raízes ignoramos ou não temos motivação para mudar. Não pode ser entendida como a destruição de algo para a construção de algo novo, dentro de padrões preestabelecidos de fora para dentro, mas, sobretudo, como a aquisição da consciência de si para aprender a ser, a existir, a se realizar como criatura rica de sentidos e plena de utilidade a vida. Imperfeições são nosso patrimônio. Serão transformadas, jamais exterminadas.

Muitas pessoas possuem indevidamente a idéia de que a transformação interior equivale a santidade instantânea. Não é. Já está demonstrado pela ciência que a natureza não dá saltos e, portanto, devemos nos alegrar com as conquistas paulatinas e permanentes. A impossibilidade da rápida espiritualização pode descambar num outro tipo de santidade, a de adorno, da aparência, da superficialidade, o que é extremamente nocivo. A dimensão empresarial, por exemplo, viveu recentemente uma febre da mudança abrupta através da reengenharia e o resultado foi a quase extinção de muitas organizações que adotaram esta prática. A filosofia japonesa do Kaizen, ou seja, de melhorias contínuas parece ser a mais recomendável, tanto para o mundo organizacional como para o nível dos indivíduos. A proposta espírita igualmente é de aperfeiçoamento permanente e não de perfeição imediata. O objetivo é sermos melhor e não os melhores.

A escritora Louise Hay lembra apropriadamente que "quando realmente amamos, aceitamos e aprovamos a nós mesmo exatamente como somos tudo na vida funciona". E é verdade. O primeiro passo para o autoburilamento é o desafio de encontrar-se consigo e gostar-se do jeito que é, na perspectiva de mudança continuada. Allan Kardec também advertiu que o verdadeiro espírita não é aquele que já está pronto, porém o que se esforça diariamente no domínio das suas tendências inferiores.

Deus permite um novo recomeço todos os dias, todos os instantes. Eis a grande dádiva a ser aproveitada. Se cair, levantar, sacodir a poeira e dar a volta por cima. Chico Xavier costumava dizer que "embora ninguém possa voltar atrás e fazer um novo começo, qualquer um pode começar agora e fazer um novo fim." Jesus quando curava os doentes alertava que daquele momento em diante deveria se buscar a ser uma nova pessoa quando aconselhava "vais e não peques mais".

O esforço de mudança ganha corpo a cada dia nas pessoas no mundo inteiro. É claro que passaremos por situações graves que devem ser compreendidas como sintomas do expurgo do mal em agonia. A fase de regeneração planetária, pouco a pouco, avança, enquanto a de testes e resgates declina. Um novo tempo surge. Um novo homem começa a nascer. Já vivemos timidamente a maioridades das idéias espíritas na terra que não deve ser confundida com caracterização emblemática, mas como postura de entendimento e condução da vida. Não haverá força que consiga impedir o crescimento do homem neste planeta. A era do espírito lança seus primeiros raios no horizonte e se fará dia na consciência de todos num futuro não muito distante.

Por  Carlos Pereira (baseado no livro Reforma Íntima Sem Martírios, de autoria do espírito Ermance Dufaux, pela psicografia de Wanderley Soares de Oliveira, Editora Inede)

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Um Ser Inteiro

Vivemos num universo dual. Para qualquer coisa que possamos imaginar, existirá o seu extremo oposto: o bem e o mal; o bonito e o feio; o macho e a fêmea; o preto e o branco; o claro e o escuro; e assim por diante. Enfim, para qualquer coisa existente nesse Universo, pressupõe-se a existência do seu oposto complementar. Assim, não é de se espantar que nós mesmos, como indivíduos únicos, também possamos possuir ambos os extremos. Somos seres duais e precisamos encontrar nosso ponto de equilíbrio.

Muitas vezes a busca por este equilíbrio ocorre através de experiências dolorosas ou que nos desafiam, mas é dessa forma que chegamos a nos conhecer melhor, a saber o que desejamos e a como conquistá-lo, justamente porque ainda não temos consciência deste processo.

Já que somos seres duais, obviamente possuímos dois lados extremos: o lado luminoso ou o “lado bom”; e o lado sombrio ou o “lado mau”. É muito curioso observarmos que a grande maioria das pessoas prefere jamais enxergar o lado sombrio das coisas, quanto mais delas próprias. Elas temem o “Mal” e não percebem que ele é apenas a extremidade oposta do ”Bem”. Ambos se complementam. Um jamais existiria sem o outro. O assim chamado “Mal” serve a um grande propósito. O julgamos apenas porque ele parecer ser ruim, até que descobrimos que nós mesmos somos nossos próprios inimigos. Para que possamos chegar a um equilíbrio de forças se torna necessário, antes de mais nada, reconhecer que todos nós possuímos esse lado escuro em nossas personalidades. O mais irônico nisso tudo é o fato de que tudo aquilo que preferimos não observar é o que controla nossas vidas.



O estado de unidade consigo mesmo não sugere perfeição, onde só deveriam ser incluídos os aspectos “bons” da natureza humana. Pelo contrário, sugere integração total, onde cada qualidade humana - positiva ou negativa - tem seu lugar e está harmonicamente contida dentro do todo. A natureza do conflito “luz” e “trevas” não é boa nem má; é necessária ao desenvolvimento, pois é através dela que conseguimos, eventualmente, ampliar e integrar nosso “eu” total. A dualidade humana é muito perturbadora, no sentido de que fingimos não perceber que tudo aquilo que se encontra na luz projeta uma sombra escura. O Bem e o Mal, quer ou não existam objetivamente, são impulsos exteriores do pensamento humano consciente e inconsciente, ambos vivem dentro do indivíduo e não no mundo fora dele,  e antes de serem dois inimigos eternos, devem ser encarados e definidos como duas faces de um único indivíduo. Na verdade, aquilo que consideramos ser “Mal” não é senão a nossa ignorância acerca dos valores e qualidades do nosso “eu” total, e também da nossa tendência de nos retalharmos em pedacinhos, a maioria dos quais jogamos fora e acreditamos que estamos livres deles porque não os aprovamos.  Por isso torna-se tão necessário o autoconhecimento.

O primeiro passo para o autoconhecimento é compreender que somos responsáveis por nossas ações. Tudo o que acontece em nossas vidas é criado pela força de nossos pensamentos. Alegria ou Dor, Vitória ou Queda, Amor ou ódio, nada acontece sem que tenha sido idealizado e posto em movimento pelo pensamento. Durante toda a nossa vida criamos o nosso mundo de acordo com nossos padrões de pensamento, que por sua vez produzem uma realidade exterior. Misteriosamente as experiências que enfrentamos são atraídas para nós pelo poder de nosso próprio pensamento e embora não saibamos ao certo de que forma o interior e o exterior podem se refletir mutuamente, sabemos que isso acontece na vida de todas as pessoas.

Essa é nossa primeira grande lição: aprender a nos tornarmos responsáveis por nossos próprios atos e por aquilo que eles criam. Enquanto não nos tornamos conscientes de determinadas características que possuímos encontraremos pessoas ou situações que as reflitam ou as vivam por nós. E continuaremos vivendo num mundo de Trevas. Toda a realidade externa é reflexo de nosso mundo interno, porque é da Lei que o Equilíbrio deva existir. Se hoje vivemos num mundo de injustiça, violência e desigualdade, é porque ainda não reconhecemos tudo isto dentro de nós. E assim, o equilíbrio se processa.

Por isto é imprescindível o autoconhecimento. Quando estivermos completos em nós mesmos, deixaremos de lado a necessidade de projetar externamente nosso lado obscuro, nos tonaremos senhores de nossas próprias ações, de nosso próprio destino. E Luz e Trevas, Bem e Mal, estarão integrados em nós, sairemos do mundo ilusório da dualidade para a Verdadeira Unicidade.

Por Cristina Lessa Cereja